Dois garotos chegaram à beira do lago. No frio, portavam aos pescoços cachecóis quentes que cultivavam a saúde de seus corpos, escondendo a saúde de suas mentes. Pararam à beira - lago grande -, e pensavam, cada qual com seus botões.
Um dos jovens, mais jovem, mexia-se pouco. Não era tão ansioso quanto o outro, mais velho, que se mexia sem parar rodando no redemoinho imenso da própria mente. O jovem mais novo parava com o olhar fixo para o horizonte daquele mar imenso, e apenas refletia, e descobria em cada novo átomo de vida algo diferente. Sua mente, mais oxigenada, mais limpa, menos condensada que a do pobre vivente mais velho, essa mente maravilhosa formulava soluções impossíveis para todos os seus problemas: pensava no que fazer, na infinita possibilidade de coisas para se fazer na vida. Ler um livro no topo de uma montanha era o mesmo que caçar corujas em um bosque nevado na noite escura, ou o mesmo que tomar uma cerveja em um bar comum com seus velhos amigos - tudo era pequeno e insignificante diante da imensidade da vida; tudo era maravilhosamente belo porque era vida, e isso tudo ia o consumindo aos poucos, e transformando-o novamente, e o aprontando para novas vidas, para novas coisas, para novas maravilhas do mundo que nada mais era do que uma bolinha de papel bem grande, que ele podia manipular ao belprazer sem maiores incomôdos.
O outro jovem, na verdade, era uma mentira. Não era jovem, por sinal, aqui mentimos pela beleza da imagem: um senhor já, cerca de 50, 55 anos. Era um monumental dinossauro da vida, um mal-resolvido tecodonte ao qual haviam esquecido de avisar de sua morte. Nesse tecodonte imbecil, mil e uma manipulações do descontentamento possuíam sua mente absurdamente cheia, e cheia de consequências, e cheia para sempre. Aquele senhor não acreditava mais em nada: tudo era uma impossível manipulação de bruxedos infinitos dos deuses do universo para que tudo desse errado. Seus filhos tinham suas famílias, sua mulher não lhe dava mais bola, era um aposentado sem ocupações que lutava por mais e mais inimizades de seus antigos amigos. Não encontrava mais gosto em nada, nem no que fazia, nem no que bebia, nem nada, nem nada. Naquele momento, olhava para o sol se pondo ao fim da linha do horizonte e pensava que nada fazia sentido naquela imensidão de acontecimentos sem sentido que era a vida desde sempre. "Viver para que? Nascer, comer, crescer, trepar, morrer? A troco de que diabo de coisa, a troco de que porra? Sou essa porra de..."
Suas reticências foram tão longas quanto o tamanho do que era o coração do jovem ao seu lado. Naquele coração cabia todo o mundo que viria ainda, cabia inclusive comiseração por aquele senhor.
- Como é seu nome, senhor?
- Meu nome? Por que quer saber, menino?
- Para nada, preciso de um porquê para isso?
O jovem falou “isso” com aqueles olhos brilhando no horizonte, fulgurantes, maravilhosos. Talvez sua menina o estivesse esperando em casa, talvez fosse encontrar seus amigos, talvez fosse escalar o Everest logo a seguir, talvez qualquer coisa.
Mas a verdade é que apenas curtia o vento batendo em sua cara e ouvia o coração do mundo bater adoidado. Convidou o velho para sentar ali, junto consigo, e ali ficaram, por várias horas, sentados, olhando para o horizonte, e trocando suas considerações sobre a vida.
Quem olhasse com os olhos certos aquela cena juraria que o velho brilhava cada vez mais, cada vez mais, e, aos poucos, junto com aquele garoto, substituía a luz do sol que se punha no horizonte, no horizonte gigante do tamanho de tudo...
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... na linha infinita do horizonte que já não mais delineava sua vida.
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